Sentença Cautelar

Tribunal Administrativo de Circulo
Lisboa




Processo nº: 100/2011.À.cautela.é.melhor.que.nasça



CONCLUSÃO- 21-05-2012




I. João Bemnascido, BI nº1881777 com validade até 18/05/2013, NIF 444356247, casado, empresário, com residência na Avenida Duque de Loulé, nº13, 1000 Lisboa, requereu o presente Procedimento Cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo contra a requerida A.R.S.L.V.T. – Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, IP., Pessoa Coletiva Pública, com morada na Avenida dos Estados Unidos da América, nº77, Lisboa, em que é contra interessada a Maternidade Ângela Beatriz, com morada na Rua Caracol Saloio, em Loures.
                Para tanto, alegou o requerente não só o incremento de custos que para a família adviria da mudança de unidade de saúde, visto que já tinha mudado de residência uma vez para um imóvel localizado junto da Maternidade, e que com esta transferência ter-se-iam de mudar novamente, uma vez que face ao quadro psicológico debilitado da sua esposa, fora aconselhado a acompanhá-la no decurso da gravidez, com o risco inerente que o transporte acarretaria para o feto, e, ademais, a falta de condições das novas instalações, em virtude da inexperiência do seu pessoal médico e da inexistência de uma unidade de neonatologia, essencial ao acompanhamento destas situações.
                 Termina, pedindo a suspensão do ato pelo requerido praticado, portanto, a transferência da sua esposa, Maria da Esperança, para a nova unidade hospitalar.
                Junta um documento e uma procuração forense.
                Foi proferido despacho de aceitação da providência e procedeu-se à citação do requerido e dos contra interessados.

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                O requerido, regularmente citado, não apresentou oposição à providência.
                Veio ao processo a contra interessada, Maternidade Ângela Beatriz, deduzir oposição à providência, alegando a ineptidão da Petição Inicial, por se não identificar o ato que se pretendia suspenso e por se não verificarem os pressupostos da providência cautelar requerida.
Juntou uma procuração forense, um documento e um documento único de cobrança.
                O Tribunal é competente em razão da matéria (Tribunais Administrativos), hierarquia (art.44ºnº1 ETAF) e territorialidade (art.16º CPTA).
                O processo é o próprio e não está viciado de nenhuma nulidade que o invalide no seu todo.
                As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e, dado o seu interesse na causa são legítimos encontrando-se devidamente patrocinados (“(…) personalidade judiciária e a capacidade judiciária são pressupostos processuais que dizem respeito a atributos próprios, ou seja, necessários para que uma pessoa ou entidade possa ser parte em qualquer processo administrativo e possa estar, por si própria, em juízo nesse processo. A personalidade e a capacidade judiciárias coincidem com a personalidade e a capacidade jurídicas” cfr. Mário Aroso de Almeida; pág. 215 e ss. do Manual de Processo Administrativo, 2010).
                Não existem nulidades, exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa e de que cumpra conhecer.

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II. Dos autos e com relevância para a presente decisão, resultam, em função dos documentos apresentados, os seguintes FACTOS INDICIARIAMENTE PROVADOS:

1.      O Casal é acompanhado desde há dez anos na Unidade de Fertilidade da Maternidade Alfredo dos Campos;
2.      A esposa do requerente encontra-se desde o dia 6 de Maio, com 15 semanas de gestação;
3.      A esposa, Maria da Esperança, desenvolveu vários problemas de saúde associados à gravidez;
4.      O diagnóstico da grávida é de alto risco;
5.      Encontra-se internada, desde as dez semanas de gestação;
6.      A equipa que acompanha a paciente não aconselha a transferência:
7.      O ato abrange a paciente;
8.      A unidade mais próxima encontra-se situada em Loures, na Maternidade Ângela Beatriz;
9.      As viagens podem provocar o risco de deslocamento da placenta e consequente risco para o feto;

E os seguintes FACTOS INDICIARIAMENTE NÃO PROVADOS:

10. Na equipa multidisciplinar são todos do quadro clinico da maternidade há muitos anos;
11. Têm elevada experiência e sucesso em casos semelhantes;
12. E já trataram pacientes com quadro clinico idêntico de todas as partes do país.


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FUNDAMENTAÇÃO:

O tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados na análise da prova documental carregada para os autos (v.g. Relatório médico apresentado), a qual merece credibilidade e revela isenção.
Os factos não provados, resultam da total ausência de prova.

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III. Aplicação de DIREITO:

Atenta a factualidade indiciariamente provada, entre requerente e queridos, cumpre prenunciar nos seguintes termos:

1.      Existe um ato administrativo, conforme art.º 120º CPA, portanto, existe uma decisão de um órgão da administração que é o Presidente da A.R.S.L.V.T. IP, que produziu efeitos numa situação individual e concreta.
2.      Requerida a Providência, nos termos do art.º 112º/2 a) CPTA, tendo sido regularmente citados e perante a ausência de produção de prova (118º/1 e 2 CPTA), cabe tomar posição sobre a existência de pressupostos de procedência do pedido, o que se faz nos termos e fundamentos seguintes:

O relatório entregue pelo requerente faz prova inequívoca da frágil condição clinica da parturiente, visto que a esfera da procedência da ação principal não seria suficiente para tutelar os interesses em causa, por virtude da deslocação poder originar danos irreversíveis no feto e na própria parturiente, logo, a ação principal não traria efeito útil algum à causa. Veja-se que se encontra em gestação de alto risco, com sintomas de depressão “major” e eminência de deslocamento da placenta, pelo que se encontra plenamente verificada uma situação de “periculum in mora” (“ quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” , cfr. José Vieira de Andrade, justiça administrativa, 10ª Edição, Pág. 350)
Tendo sido o ato praticado pelo Presidente da A.R.S.L.V.T,IP, e existindo dúvidas sobre as suas atribuições para a prática do ato, considera-se que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão da requerida. Dá-se por inteiramente verificado o requisito da existência de aparência de um direito. (“A lei basta-se com um juízo negativo de não improbabilidade (non fumus malus) da procedência da ação principal para fundar a concessão de um providência conservatória, mas obriga a que se possa formular um juízo positivo de probabilidade para justificar a concessão de uma providência antecipatória”, cf. José Vieira de Andrade, justiça administrativa, 10ª Edição, pág. 354 e 355).
Considera ainda, o douto Tribunal, não haver motivo para recusar da providência cautelar nos termos do nº2 do art.º 120 CPTA, dado que, realizando um juízo de ponderação dos interesses em causa, v.g. o interesse da requerente e o interesse público, não existe manifesta desproporcionalidade, visto que os danos que possam ocorrer da procedência não são superiores aos que podem resultar da recusa.
A perda de uma vida humana, ainda que não autónoma, e a séria probabilidade de danos físicos e psicológicos para a parturiente, são valores intrínsecos ao Estado de direito português que não podem ser desconsiderados, pelo que a não realização da transferência, e o consequente prejuízo dela resultante, notoriamente não se assemelham aos que podem resultar da procedência da ação, não se justificando, assim, o provimento do pedido dos contra-interessados. (“(…) Na realidade, o que está em causa não é ponderar valores ou interesses entre si, mas danos ou prejuízos e, portanto, os prejuízos reais, que numa prognose relativa ao tempo previsível de duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam da recusa ou da concessão (plena ou limitada) da providência cautelar. “, cf. José Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 10ª Edição, pág. 358)










IV. DECISÃO:

            Pelo exposto, e ao abrigo das invocadas disposições legais, julgo a requerida providência cautelar procedente, por indiciariamente provada, determinando a suspensão da eficácia do ato administrativo praticado pelo Presidente da A.R.S.L.V.T., IP, relativamente a Maria da Esperança Bemnascida.

Aplique às custas o disposto no art.º 453 CPC, ex vi, art.º 1 CPTA.




                        Registe e notifique.

                                              
                                                                                                          Juiz de Direito 

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